Ai que saudade d’ocê
Eu estava sempre com ele chegando à escola, de mãos dadas, em meio a uma avalanche de mães com seus filhos. A ida e a volta do colégio nos eram sagradas. Mães de grandes amigas sempre me contaram como ele ia perguntar qual a mochila legal para também comprar pra mim, em qual lugar encontrar o carrinho da moda que carregava a bolsa. Ficava logo amigo das minhas professoras e adorava contar os elogios que, dizia ele, elas me faziam.
Ao reunir suas fotos para esse livro, encontrei várias em que ele me olhava profundamente, como quem diz “sou seu painho e sempre vou estar aqui pra você”. Ao reler nossas conversas no WhatsApp, mesmo quando não havia contexto no assunto, várias vezes ele dizia algo parecido com isso, que estaria comigo para sempre. Eu tenho procurado formas de ele ter partido só mais ou menos e cada dia me convenço mais de que, sim, ele sempre estará comigo. Estará neste livro, em cada vez que (você que me lê e eu) estivermos juntos, a cada vitória que eu conquistar, em cada pessoa que eu procurar dar força e ajudar, cada sorriso verdadeiro que eu der.
Sei que dizem por aí que não somos felizes sempre e que temos apenas momentos de alegria, mas imagine que eu fui ensinada, desde muito cedo, que somos felizes todo dia e temos apenas momentos de baixa (“mas isso, passa, filha, tudo sempre passa”). E assim, tendo a maior sorte que alguém pode ter na vida, tendo o pai mais diferente e cheio de amor, como eu poderia acreditar que não? E aí eu tenho caçado formas, formas de aliviar essa saudade d’ocê, essa saudade sem fim. Sou uma boa caçadora.
Nesses pensamentos de busca, penso em como ele nos diria o que aconteceu, como Caby nos confortaria sobre a sua partida. Penso que seria mais ou menos assim, falando pra mim, juntando e resumindo tudo que ouvi dele:
“Filhinha, veja só, painho vai precisar ir agora. Quando o ‘barbudo lá de cima’ chama, não tem jeito. Tem que ir. Mas não é pra ficar triste muito tempo, tá bem, meu maior afeto? Essa é a lei da vida. Olhe como Deus foi bom pra gente. Painho poderia ter ido, pela mesma doença, quando você tinha uns três ou quatro aninhos e aí a gente não teria ido tantas vezes à escola, eu não teria a relação tão linda que tenho com a sua mainha, eu não teria te apoiado nos términos de namoro e mandado você comer feijão, não teria visto você passar no vestibular, não teria usado sapatos e dançado até de manhã na sua formatura, nem teríamos comemorado o resultado da seleção de mestrado, que foi bem no dia do seu aniversário e nós comemoramos juntos por dias, lembra? E o principal, filha, eu não teria te apresentado tanto que você pode conquistar o que quiser na vida e dito pra você se amar sempre. Agora painho vai, mas deixa você profissional, crescida, com sua irmã e sua mainha, cheia de amigos tão bons, suas tias e tios, tem seu namorado e sua cachorrinha. Seja forte e corajosa, porque mar calmo nunca fez bom marinheiro e tem uma coisa que você não pode esquecer: painho sempre vai estar com você”.
Aos amigos e amigas, eu faço uma extensão do conselho que ele me daria. Só precisamos adaptar as experiências vividas. Agradeço imensamente pela amizade compartilhada, pelo amor que ele recebeu aqui na terra e hoje em forma de oração. Sou muito grata por ser “Alicinha de Caby” e por tudo que ele representa. Que belo dia o que minha mãe passou em frente à rádio e, naquele momento, Deus sacramentou que muitos anos depois eu viria para eles. Sempre gostei da forma que ela conta quando ele me viu pela primeira vez e aquilo parecia encontro de almas. Era mesmo. Tenho ainda muitos desejos deles a cumprir e, com vocês, vamos passo a passo. O mais importante deles, para todos nós, é que sejamos felizes. Enquanto ela volta, a gente tenta e não me admiro se um dia um beija-flor invadir a porta da minha casa, me der um beijo e partir. “Te mando um monte de beijo. Ai que saudade d’ocê”.